15 de mar. de 2025

[Filme] Dragon Inn (1967) - King Hu

 Tudo bem? Aproveitando a empolgação pelo novo projeto com os filmes, aqui vai mais um da lista da Criterion Collection. O filme da vez é Dragon Inn, de 1967.

Detalhes

Diretor: King Hu

País: Taiwan

Ano: 1967

Duração: 111 minutos

Elenco: Lingfeng Shangguan. Chun Shih, Ying Bai, Chien Tsao.

Produtora: Union Film Company 

Sinopse

Tsao é o eunuco mais poderoso do imperador e exerce um papel perigoso por meio de táticas desonrosas. No jogo de poder da China, Tsao consegue derrotar o General Yu, seu maior rival político, e, após a derrota, ocorre o exílio dos filhos sobreviventes do general. Diante do perigo que eles representam, Tsao decide, sorrateiramente, orquestrar o assassinato dos herdeiros do general antes que cruzassem a fronteira.

Durante o plano de interceptação dos exilados, a polícia secreta de Tsao arma uma emboscada no Dragon Inn, um ponto de descanso para aqueles que atravessam a área desértica, percorrida também pelos filhos de Yu. Durante a tomada da pousada, Hsiao, um poderoso lutador de artes marciais, aparece e se recusa a sair, superando as investidas dos agentes secretos de Tsao, afirmando que só deixará o local após ver Wu Ming, o dono da pousada. O fato desconhecido dos invasores é que Wu Ming é um antigo tenente do General Yu e convocou Hsiao para proteger o local e os sobreviventes do seu antigo líder.

No meio desse conflito, dois irmãos, também lutadores de artes marciais e filhos de outro tenente do General Yu, chegam e se aliam à resistência na pousada. Todo o confronto explode com a chegada dos filhos do General Yu, seguida do franco ataque dos soldados de Tsao e da luta desesperada de um pequeno grupo de lutadores contra um exército. 

Impressões

Com base em experiências anteriores com filmes wuxia, "Dragon Inn" apresenta pontos muito bons, embora também tenha aspectos que poderiam ser aprimorados. A história é envolvente e a criação do clima de tensão durante os constantes perigos enfrentados pelos heróis, tanto antes quanto após a chegada dos filhos do general, é muito bem trabalhada. Foi o primeiro filme do gênero que assisti com um foco maior na narrativa; em outras obras, a introdução justificava o roteiro, mas o restante consistia basicamente em sequências de lutas.

A única ressalva diz respeito às coreografias das lutas, que são mais simples. Em alguns momentos, o diretor utiliza recursos de câmera para realizar transições rápidas, tentando dinamizar as batalhas, mas que, para mim, não compensaram a simplicidade dos movimentos.

Curiosidades

  • Dragon Inn foi regravado duas vezes, a primeira em 1992, com o título de New Dragon gate Inn, e a segunda em 2011, recebendo o título de Flying Swords of Dragon Gate.

Nota

★★★★



8 de mar. de 2025

[Filme] The Unknow - 1927 (Tod Browning)

Olá! Como vão? Depois de muito tempo, retorno para o site. Muitas coisas aconteceram nesse período e o meu hábito de leitura acabou ficando de lado, infelizmente. Estou reorganizando minha vida para voltar a ler a também pensei em complementar os textos daqui com as coisas que assisto, principalmente filmes. Vamos fazer o teste para ver se fica legal. 

O filme escolhido para a estreia é The Unknow, do Tod Browning. A escolha não se deu por nenhum motivo em especial, estava olhando uma lista de filmes que fazem parte do catálogo da Criterion e acabei optando por reassistir essa obra. Acredito que a primeira vez que assisti foi há seis ou oitos anos.

Detalhes

Diretor: Tod Browning 

País: Estados Unidos

Ano: 1927

Duração: 75 minutos

Elenco: Lon Chaney, Joan Crawford, Norman Kerry, John George, Nick de Ruiz, Frank Lanning

Produtora: Metro-Goldwyn-Mayer Pictures Corporation 


História

Alonzo (Lon Chaney) é um aclamado atirador de facas que faz grande sucesso por não ter os dois braços e atuar em um circo de aberrações. Ele se apaixona por Nanon (Joan Crawford), sua auxiliar no espetáculo de lançamento de facas e filha da dona do circo.

No entanto, Alonzo guarda dois grandes segredos que apenas seu fiel amigo, o anão Cojo (John George), conhece: ele, na verdade, possui ambos os braços e esconde essa informação após cometer uma série de crimes. A polícia descobriu que os delitos foram praticados por um homem com dois polegares em uma das mãos, o que o levou a esconder sua condição.

Enquanto mantém sua paixão em segredo e se mantém discreto para não atrair a atenção da polícia, Alonzo percebe o surgimento de um rival amoroso: Malabar (Norman Kerry), o Colosso. De maneira traiçoeira, ele se aproxima do homem e finge ajudá-lo a conquistar Nanon, incentivando-o a agarrá-la com suas mãos fortes. Contudo, ele omite um detalhe crucial: Nanon tem uma fobia relacionada ao toque de mãos masculinas, o que favorece suas chances de conquistá-la.

Certo dia, o dono do circo descobre o passado criminoso de Alonzo, e os dois entram em confronto. O pai de Nanon se surpreende ao perceber que o atirador de facas possui mãos e acaba morto por ele. No momento do crime, Nanon, sem conseguir ver o rosto do assassino, avista pela janela um homem com dois polegares na mão esquerda estrangulando seu pai. Com isso, a polícia retoma a busca pelo criminoso com polidactilia, mas descarta Alonzo como suspeito, já que ele continua fingindo ser um homem sem braços.

Após o crime, Alonzo decide não seguir a caravana e convence Nanon a ficar também, ganhando mais tempo ao seu lado. Durante esse período, ao ser beijado e abraçado por sua amada, ele confidencia a Cojo o desejo de se casar com ela. No entanto, o amigo o alerta de que seria impossível manter seu segredo em um casamento, já que qualquer contato físico poderia revelá-lo.

Convicto de que eliminar seus braços seria a única forma de conquistar Nanon, Alonzo toma uma decisão extrema: chantageia um cirurgião ligado ao seu passado para amputá-los. Após o procedimento, passa semanas se recuperando até estar pronto para retornar.

Quando finalmente volta, é recebido por uma Nanon radiante, que deseja compartilhar uma novidade: enquanto ele esteve ausente, Malabar retornou e conseguiu ajudá-la a superar sua fobia de mãos masculinas. Além disso, ela se apaixonou pelo Colosso, e os dois estão prestes a se casar. A revelação desencadeia uma crise de riso e desespero em Alonzo, que percebe ter perdido sua amada e amputado os braços em vão.

Após se recuperar do choque, Alonzo descobre que o casal estreará um novo espetáculo. Malabar será amarrado a dois cavalos puxando em direções opostas, mas, em segredo, os animais estarão correndo sobre esteiras, sem exercer força real. Como vingança, no dia da apresentação, Alonzo ataca o operador da estrutura e desliga as esteiras, fazendo com que Malabar realmente enfrente a força dos cavalos, ficando à beira de ter os braços arrancados.

No meio da confusão, Nanon tenta acalmar um dos animais, que se assusta e avança para atacá-la. Ao vê-la em perigo, Alonzo corre para protegê-la e acaba atingido pelo cavalo, morrendo pouco depois. Logo em seguida, os animais são contidos e Malabar é retirado da estrutura mortal.


Impressões

The Unknown foi um filme que me surpreendeu bastante na época em que o assisti. O ambiente dos antigos circos com shows de horrores, uma temática explorada em outros momentos pelo diretor, é fundamental para o clima do filme. A abordagem de temas como deficiência física e transtornos mentais é inovadora para a época e muito bem trabalhada.

A trama possui uma simplicidade característica dos filmes daquele período. Mesmo ao tratar de temas interessantes, como a fobia de Nanon, o assunto é introduzido de forma conveniente para o roteiro. No entanto, a decisão de automutilação de Alonzo é surpreendente, e o choque do personagem ao perceber que perdeu os braços à toa é um dos pontos altos do filme.

Curiosidades

  • Na versão original do filme,  Alonzo assassinava Cojo e o médico antes do seu retorno a Nanon. Eliminando, assim, todas as provas sobre o seu passado. 
  • O filme por muitos anos foi considerado perdido, tendo uma cópia encontrava em 1968, mas com cenas faltando. Posteriormente, novas cópias do filme foram encontradas, com mais cenas restauradas. 

Nota

★★★★

17 de set. de 2023

[Releituras] São Bernardo - Graciliano Ramos

Título: São Bernardo
Autor: Graciliano Ramos
Ano: 1934
País: Brasil

Olá! Como vão? Espero que esteja tudo bem. A leitura de hoje é especial. Especial por ser uma releitura. Pensando nessa questão de reler livros, pensei em qual eu poderia começar. Muitos livros acabaram surgindo em minha mente, mas pensei em escolher uma obra que já tivesse um bom tempo que li, que tivesse sido uma leitura agradável e que eu não lembrasse muito da história. Ao juntar estes três pontos, veio a minha mente, de supetão, São Bernardo, do Graciliano Ramos. Quando o li pela primeira vez, gostei bastante e me senti envolvido pela história, envolvido pelos sentimentos do Paulo Honório e pela jornada de ascensão e queda do fazendeiro. Hoje, relendo após 10 anos, percebo novas camadas na obra e, certamente, há mais camadas que ainda me são intocadas. 

São Bernardo foi publicado pelo Graciliano Ramos em 1934. Foi uma obra que rendeu importante projeção ao escritor. A história é ambientada em Viçosa, interior de Alagoas, local tomado pela pobreza, fome e exploração do trabalho. Um ambiente comandado por coronéis que controlam os movimentos políticos e sociais da região. Dentro deste contexto surge um protagonista filho da pobreza que consegue, num contrafluxo, ascender socialmente. 

Resumo da obra

O Romance é narrado na primeira pessoa pelo protagonista, Paulo Honório. Este se define como um homem de 50 anos, 80 quilos, sobrancelhas cerradas, mãos grossas e calejadas pelo trabalho no campo e rosto vermelho e cabeludo. A história é contada de forma desordenada, por estar habituado a "tratar com matutos", e conta com ajuda de alguns amigos para o ajuste da escrita. 

Paulo Honório não conheceu os pais e foi criado por um cego e por uma mulher chamada Margarida, em que sobreviviam com a venda de doces produzidos pela mulher e comercializados pelo protagonista, além de diárias no trabalho com a enxada. Ao completar 18 anos, envolve-se com a Germana e acaba por matar João Fagundes, amante da mulher. Por tal crime passa 3 anos, 9 meses e 15 dias preso, aprendendo a ler nesse período por meio de bíblia. Ao sair da prisão descobre que a antiga companheira tornou-se prostituta com a fama de possuir doenças venéreas. 


Ao sair da prisão começa sua jornada de ascensão. Decide pegar 100 mil-reis emprestados com um agiota e investe no mercado local. Durante esse período conhece o Dr. Sampaio, importante fazendeiro da região, que dá um calote num negócio evolvendo gado e acredita que por meio de sua influência fará com que Paulo Honório desista da cobrança. Neste momento o protagonista arma uma emboscada contra o coronel e quita a dívida, ameaçando de morte todos os que tentarem uma retaliação.

É durante este período da vida como mercador viajante que foca sua atenção em São Bernardo, a fazenda em que trabalhou quando mais novo e que agora está nas mãos de Luís Padilha, filho do homem que concedeu seu empréstimo e antigo coronel da região. Padilha recebeu por anos investimos do pai para que se torna doutor, mas o jovem sempre uma vida mais fácil e, com a morte do pai, não seguiu com os negócios agrícolas, transformando as terras da família em um local abandonado. Paulo Honório vê tal situação como uma oportunidade, em que decide emprestar dinheiro e a amizade ao herdeiro que só tem as terras como posse. 

Ao cobrar a dívida adquirida por Luis Padilha, acaba conquistando São Bernado e logo trata de redefinir os limites de suas terras, inicialmente para recuperar o que foi roubado e posteriormente para roubar as terras daqueles que possuem menos influência, como a dos Mendonças, em que o patriarca foi misteriosamente assassinado num momento que Paulo Honório possuía um duvidoso álibi. 

Os anos passam, Paulo Honório recruta pessoas importantes para auxiliarem no seu trabalho e expande sua zona de influência e é neste momento que conhece Madalena, jovem e bela professora de 27 anos que possui alguns pensamentos destoantes ao do protagonista. Mesmo não concordado com muito do que é pensado pela jovem mulher, Paulo Honório desenvolve uma atração pela mesma e a pede em casamento, aceito após um certo período de relutância. 

O Tempo passa e Paulo Honório se torna um coronel da região, respeitado, temido, casado e pai. É nesse período que os medos e inseguranças do protagonista começaram a corroer tudo o que conquistou. Durante conversas entre os funcionários, ouve temas que considera perigosos, como o acesso à educação, melhores condições de trabalho e reforma agrária. Tais temas são endossados por sua esposa, principalmente o da educação, e isto incomoda muito o protagonista, por defender que o desejo pelo trabalho rural pode ser prejudicado pelos anos de estudo e que os mais pobres só necessitam de estudo ao ponto de terem acesso ao título de eleitor. Pouco a pouco Paulo Honório destrói as relações com os amigos e a esposa, Margarida suicida-se devido ao horror que passa a viver diante do ciúme patológico e acusações de diferentes traições que teria realizado. Alguns antigos amigos são demitidos, por serem sementes de uma possível revolução, e outros vão embora ao perceberem que tudo ali mudou. 

E assim Paulo Honório termina só. Assombrado por fantasmas do passado e acusado de seguir aquilo que tanto condenou: o comunismo. Mesmo diante da sua queda, em que ouve constantemente vozes que pensa ser sua esposa, e com constantes invasões a suas terras, em que precisa aceitar calado, já que não é mais quem detém o poder na região, vê tudo de uma forma inflexível. Sendo condenado a viver por tempo indeterminado com suas dores. 

Crítica

São Bernardo faz um retrato seco da vida rural num nordeste da primeira metade do século XX. Paulo Honório nasce na pobreza e é vítima desta, até ter a oportunidade de ascender socialmente ao perceber uma oportunidade de lucro na mesma fazenda em que foi explorado. Não surpreendentemente, o personagem principal se torna aquele que o oprimiu na juventude. 

Ao longo da obra o protagonista demonstra o seu contragosto ao versar sobre acesso à educação, em que defende que a população comum não necessita de leitura para pegar numa enxada e os conhecimentos técnicos são suficientes para a realização dos trabalhos superiores, em que se inclui dentro deste último ponto. Com o avanço da história, vê que a concessão de uma educação básica pode ser uma ferramenta para conseguir favores de determinados setores do Estado e uma forma de garantir uma população votante que possui controle dentro do sistema de voto de cabresto. 

Ao falar sobre tais temas, é impossível não retomar a questão do coronelismo. Paulo Honório torna-se um coronel da região e todos os seus desejos e pensamentos passam a servir como régua moral para os que se encontram naquela região. Ir contra o pesamento político do coronel é algo condenado de forma agressiva. A influência que possui acaba por também fazer que receba favores e vistas grossas de determinadores setores importantes da sociedade, como quado o juiz local finge não saber que São Bernardo está roubando terra de vizinhos. 

O comportamento que fez Paulo Honório crescer é o mesmo que causa sua queda. Desconfiado, passa a suspeitar das conversas dos amigos, das cartas da esposa, dos movimentos dentro da casa. O fato de não ter nenhuma prova das traições e envolvimentos com movimentos comunistas por parte destes é o que faz Paulo agir. Age demitindo amigos, cometendo violências com a esposa, negando o filho. Acaba só e mesmo diante da solidão não se arrepende de quem é, sabe que é inerente a si, mas corrói com a dor. Ao fim, vê perdendo tudo por não ter mais motivo para seguir em frente e sabe que agora é a hora dos outros coronéis tomarem tudo que conquistou, assim como um dia fez. Tal inércia do protagonista reflete o conhecimento que tinha sobre como funcionava a lei na região. A lei era o coronel, a religião era o coronel. Mandava quem tinha a faca na mão. 

São Bernardo é uma obra que certamente vale a leitura. Reler o livro me fez ter uma noção melhor do contexto histórico da obra. Na minha primeira leitura, há um pouco mais de dez anos, fui bastante atraído pela questão psicológica existente dentro do texto e hoje consegui entender a profundidade que esse fator psicológico se mistura com a máquina de poder daquela região. 

★★★★★

Trecho da Obra 

"Tive abatimentos, desejos de recuar; contornei dificuldades: muitas curvas. Acham que andei mal? A verdade é que nunca soube quais foram os meus atos bons e quais foram os maus. Fiz coisas boas que me trouxeram prejuízo; fiz coisas ruins que deram lucro. E como sempre a intenção de possuir as terras de S. Bernardo, considerei legítimas as ações que me levaram a obtê-las." 




21 de ago. de 2023

[Diário] Como anda a vida?

Olá, Tudo bem? Aparecer aqui depois de tanto tempo é algo que soa meio estranho e o interessante é perceber que nem faz tanto tempo assim. As coisas vão vem por aqui, obrigado por perguntar, mas estão bem animadas. Assumo que com tantas coisas novas acontecendo, a residência em medicina de família, as novidades do Rio de Janeiro, o novo processo de adaptação numa nova casa… tudo isso fez com que a leitura ficasse mais de lado por alguns meses. Porém, sempre há aquele caminho que, independente do que se faça, sempre se volta para ele, algo que soa bem como um destino. Aliás, acabo sendo prova desse tal de destino, já que aqui estou. Peço licença para retornar a minha humildade biblioteca.

Sem mais enrolações, estou tentando organizar minhas leituras e estou bastante animado. Comprei algumas ficções nacionais e não ficções internacionais. Assinei a revista 451 e percebi o espaço vazio que fica na minha vida sem a literatura. Estou na luta para me organizar, mas é difícil. A vida de adulto é como um pequeno cobertor, independente de como o estique, sempre haverá uma parte descoberta. Não quero deixar que meu hábito de leitura seja sacrificado neste processo.

Bem, é isto. Só vim dar um oi mesmo. Até o próximo texto! Ainda não decidi o que lerei, são 00:18 e estou com sono, amanhã resolvo essa questão. Até mais!

Ah! Estava ouvindo hoje, enquanto fazia a faxina da casa, um podcast maravilhoso sobre o Lima Barreto "O Negro é a cor mais cortante". Indico!

Lima Barreto

9 de abr. de 2023

A Lista de Convidados - Lucy Foley

Olá, tudo bem? Por aqui… não sei. Acredito que agora está tudo bem, mas foi uma semana meio pesada. O processo de adaptação é meio complicado e é natural entrar em choque com algumas coisas boas e outras ruins. É isto. Sem muitas novidades por aqui. Hoje é domingo de páscoa e vamos comemorar com mais um livro!

O livro de hoje fez parte da seleção do clube de assinatura da Intrínsecos. Recentemente, o clube fechou as portas e há 1 semana descobri estarem fazendo uma queima de estoque. Com tal achado, não pude deixar de comprar vários livros e o de hoje foi o primeiro da grande leva. Hoje falaremos sobre A Lista de Convidados, da Lucy Foley.

Um Pouco Sobre a História

Título: A Lista de Convidados
Autor: Lucy Foley
Ano: 2021
País: Inglaterra

A lista de convidados fala sobre o casamento de Jullie Keegan e Will Slater numa ilha remota da Irlanda que possui a fama de ser assombrada. O local diferente chama a atenção de várias pessoas e é montada uma lista seleta de convidados para a festa de casamento. Ao longo da obra, tem-se o desenvolvimento da história em diferentes cortes de tempo dentro da ilha e com uma troca constante dos personagens que contam os acontecimentos, com diferentes posicionamentos.

Como diferentes pontos da história são contados pelos personagens, acredito que seja interessante falar individualmente de cada um, vamos lá.

Jules Keegan - É a noiva e dona da The Download, uma conceituada revista digital de moda. Sempre foi bastante decidida sobre o que queria e como queria, algo que explica o porquê de estar se casando com alguém que conhece há alguns meses. Passa uma ideia de líder e visionária inabalável, mas, na verdade, esconde as suas fraquezas. Uma dessas é a relação com o pai, em que sempre carregou o desejo de ter mais atenção dele, além de que não é tão poderosa e visionária como pensam, escondendo que escolheu a ilha isolada não só por ser diferente, mas por ser, principalmente, barata. Acredita que encontrou em Will, o seu noivo, o homem perfeito, tanto na aparência quanto na personalidade e deseja ter o casamento perfeito, não permitindo que ninguém tire o evento dos eixos. 

Will Slater - O noivo. Conhecido por sua beleza e carisma, é apresentador de um programa de sobrevivência e ganhou grande fama por tal trabalho. Sempre foi o garoto exemplar e criou uma legião de seguidores por onde passou, considerado um líder nato. Sabe que sua aparência e charme abriram várias portas e acredita que Jules é a mulher perfeita para se casar. Diz ser uma boa pessoa, mas não apresenta um lado tão belo ao perceber que alguém atravessa seus planos. 

Aoife - A dona da casa na pequena ilha e mestra de cerimônias. Casada com Freddy e juntos tocam o investimento de eventos na ilha. Aceitou trabalhar com o casamento a um preço muito menor que o normal, almejando a divulgação que o casal famoso traria. Passa uma imagem de profissionalismo, seriedade e calma durante o trabalho, mas esconde um lado ressentido sobre uma perda num distante passado que a prende à ilha irlandesa. 

Olivia - Irmã mais nova de Jules e madrinha de casamento. Aceitou o convite contra a própria vontade e sabe que está longe do seu melhor momento. Vem de um término recente de um relacionamento que a abalou de uma forma significativa, fazendo com se isolasse e começasse a praticar automutilação. Tenta esconder ao máximo o que aconteceu consigo para chegar em tal estado e vê em Hannah uma imagem de confiança para que, enfim, possa desabafar. 

Hannah - Casada com Charles, padrinho da noiva. Vem para acompanhar o marido e sempre teve dúvidas sobre o relacionamento do companheiro com a noiva. Sente-se bastante deslocada até conhecer Olivia, em que sente uma ligação automática ao perceber que havia outra pessoa além dela que não queria estar ali e ao ver uma jovem que lembra a sua falecida irmã. Ao longo das horas na ilha, questiona-se se deve perguntar ou não ao marido até onde chegou o relacionamento dele com a Julie e descobre que a história da morte da irmã será revisitada. 


Johnno - Padrinho e melhor amigo do noivo. Sempre foi o companheiro de Will, desde a época de escola, mesmo que nos últimos anos não tenham estado tão próximos. Veio de Johnno a ideia do programa de sobrevivência, em que, originalmente, deveria contracenar com o amigo, mas acabou tendo seu papel descartado. Ao chegar na festa de casamento, percebe o contraste que se tornou do Will, em que se percebe desleixado com a aparência, sem sucesso no amor ou no trabalho e visto por todos como uma piada. Contudo, não se abala com tudo isto, já que possui uma forte irmandade com o Will, fortalecida pelo segredo que carregam juntos e que o corrói até hoje. Porém, todos esses pilares que sustentam Johnno são abalados ao começar a se questionar se há reciprocidade nessa grande amizade.

Crítica

A Lista de Convidados vem com a premissa de trazer o mistério em torno de um assassinato que ocorre durante um casamento aparentemente perfeito. Com o artifício de trocar a cada capítulo quem conta a história, temos diferentes passados que se desenvolvem e culminam no assassinato mais ao fim do livro. Além disso, o recurso de contar a história paralelamente em dois momentos diferentes faz com que o mistério sobre quem morreu e os motivos sejam instigados. A escolha de colocar o assassinato no fim da obra e trabalhá-lo ao longo do texto é bem interessante.

A seleção da ilha para ser palco da história e o trabalho em torno dela é muito bem feito. Há uma ótima ambientação do local e a autora consegue passar a ideia de mistério, perigo e sobrenaturalidade. 

A escrita da autora é bem leve, envolvente e ela sabe como fazer o leitor querer ler mais a cada página que passa. Porém, nem tudo é perfeito. Os segredos da obra não são difíceis de serem previstos, além de que, a medida que a história avança, fica nítido o alvo do assassinato, fazendo com que a revelação da cena não carregue muita surpresa. 

O livro vale a leitura e indico para aquele momento que se deseja algo mais descompromissado. Foi uma boa diversão para a minha tarde chuvosa de páscoa. 
Nota 4 ★★★★☆.

Trechos

 "Às vezes, as marolas menores são as mais fortes"

"A vida não passa de uma sucessão de dias, dos quais controlamos no máximo um por vez[...]."

"[...] só porque encontramos uma forma de lidar com os nossos sentimentos, não quer dizer que eles não estejam lá."

"[...]Aqueles que tem o maior respeito pelas regras também são os que mais apreciam quebrá-las."

26 de mar. de 2023

Homem Lento - J. M. Coetzee

Título: Homem Lento
Autor: J. M. Coetzee
Ano: 2005
País: Austrália

 Olá, como estão? Espero que bem. Por aqui, a residência está me sugando e a literatura está sendo minha terapia. A luta extra é ter a coragem de atualizar a humilde biblioteca, mas isto é um detalhe. Estamos aqui e teremos mais um texto. Partiu!

  O livro de hoje fez parte da minha primeira exploração no Rio de Janeiro. Durante o horário de almoço, no primeiro dia de residência, decidi andar pelo centro da cidade e descobri que ali perto havia um sebo. Era um local bem simples e mais focados em livros escolares/universitários. Quando eu já estava de saída, percebi um livro com um "Coetzee" escrito bem grande e acabei pegando. Homem lento é um texto que eu não conhecia e acabei levando pela ótima leitura que tive com Desonra, outro livro do autor e, bem, é esta a pequena história de hoje. Sigamos com o homem lento.

Um Pouco da História

Em Homem lento temos a história de Paul Rayment, um emigrante francês na Austrália em sua sétima década de vida e que leva uma vida pacata, reservada e independente. Toda a existência do protagonista muda após sofrer um acidente enquanto andava de bicicleta em uma via pública. Ao ser atingido por um carro, acaba sendo internado em estado grave e, ainda desorientado, permite a realização da amputação de parte de uma perna. Ao acordar do procedimento cirúrgico, é informado de que a perna poderia ter sido salva, mas seria muito trabalhosa e arriscada a recuperação para alguém na idade de Paul, tendo sido decidida a amputação, seguida de reabilitação objetivando o uso de prótese. Diante de tal conversa, o protagonista surpreende a equipe do hospital ao afirmar que não deseja o uso de nenhum membro artificial, recebendo, assim, alta e acordando, contra sua vontade, o acompanhamento com uma enfermeira dentro de seu domicílio. 

Ao voltar para casa, Paul percebe que a vida não será tão tranquila quanto ele imaginava. O acordo que aceitou em contratar os serviços de uma enfermeira foi, num primeiro momento, feito só para conseguir sua alta, mas, ao ter grandes dificuldades em realizar atividades básicas, percebeu que seria uma necessidade. Contudo, o homem que sempre fez questão de ser independente, não conseguiu aceitar a enfermeira enviada, uma mulher que o tratava como um bebê e destruía o orgulho que residia dentro dele. Sendo exigindo, prontamente, pelo senhor Rayment, a troca de funcionária. 

Com o pedido de troca, conhecemos Marijana Jokic, a nova enfermeira parece ser o ideal para aquele reservado senhor em recuperação. Ela não o infantiliza, entende a necessidade de espaço do cliente, sabe como cuidar de regiões amputadas e age com cuidado. Com o tempo, Paul percebe que começa a criar sentimentos mais intensos por sua enfermeira e decide, aos poucos, conhecer mais dela, descobrindo, assim, que a mesma veio da Croácia junto ao marido e três filhos. Numa tentativa de se tornar mais próximo de Marijana, Paul tenta realizar pequenos favores, como orientar Drago Jokic, o filho mais velho do casal, e aprender sobre a terra de origem daquela amada.

No meio de toda essa mudança na vida de Paul, surge Elizabeth Costello, uma senhora misteriosa que causa uma certa irritação no protagonista por apontar constantemente para o seu comportamento problemático e os transtornos que pode estar causando por tentar adentrar no coração de Marijana e mexer no funcionamento da família Jokic.  Fazendo um adendo a sobre a Elizabeth Costello, ela é a protagonista de outro romance do autor, com título homônimo. A personagem tem um conhecimento onisciente dentro do universo da obra e deixa subentendido que está acompanhando Paul para que o mesmo sirva como inspiração ao seu próximo livro. Tal ponto é importante e pode passar batido pelo leitor, já que não é claro esse mecanismo de metaficção utilizado pelo Coetzee. 

Com o progredir da história, Paul faz a proposta de pagar os estudos de Drago. Diante de tal declaração, ocorre uma série de conflitos dentro da família Jokic que fazem com que sejam questionadas as intenções por trás do pedido e aproxima o protagonista do Drago. Nesse momento, novos sentimentos surgem e o homem lento passa a se questionar se tudo o que viveu até então foi válido ou se algo do passado dele poderia ser diferente. 

Minha Humilde Crítica

Homem Lento é um livro que possui a escrita clássica do Coetzee, com um protagonista que em diferentes momentos causa raiva, pena e indignação. Falando um pouco mais de Paul Rayment, o personagem levanta diferentes pontos ao longo do romance. Num primeiro momento, o processo de envelhecimento é algo bastante marcante e a necessidade de reaprender a viver e reconhecer o seu espaço dentro da sociedade é vivido intensamente no livro. Pessoalmente, gosto bastante dos homens escritos por Coetzee e o mesmo aborda de forma única alguns pontos importantes do universo masculino, como a desejo de manter sua linhagem, o valor dentro da sociedade e o desejo de deixar um herdeiro ou no mundo, necessidade essa trabalhada na relação entre Paul e Drago. 

 Elizabeth Costello é uma figura que enriquece a história. Uma senhora com um teor de mistério que vem de outra obra do Coetzee para escrever um livro inspirado no atual protagonista de uma obra também do Coetzee. O inexplicável poder dela de ter um controle e conhecimento dos acontecimentos dentro da história, sendo uma personagem/autora onisciente, faz com que ocorram vários eventos que tornam tudo mais imprevisível.

A família Jokic acaba entrando como uma realidade paralela do próprio protagonista. O que teria acontecido caso ele tivesse se casado com "a mulher ideal"? O que teria acontecido caso tivesse tido filhos? Ao longo do livro, Paul tenta, de certa forma, adentrar naquela família e se colocar como um apêndice dela, numa tentativa de viver algo que achou por toda vida que não precisava. Aqui que percebo importantes temas dentro do universo masculino sendo tocados, algo que acho bastante interessante, já que muitas vezes homens são escritos de forma estereotipada e com o apagamento de suas fragilidades e necessidades. 

Chegando ao fim, pensei em escrever um texto mais rápido hoje. Acabei não tocando em alguns pontos bem interessantes do livro, como a questão da Austrália e seus emigrantes, mas é que estou sem tempo. Curto bastante a produção do Coetzee e essa é uma obra que vale a leitura. Acredito que teria curtido um pouco mais a história caso tivesse livro o livro Elizabeth Costello antes, mas… é a vida.

 Indico! 4 estrelinhas★★★★☆.

Trechos 

"Aqueles de cuja vida se nasce não morrem.{...} Você leva esses com Você, assim como espera ser levado por aqueles que vêm depois de você." 

"[...] Mas ser amado tem um preço, a menos que a gente seja inteiramente sem consciência." 

"Desculpe ser tão complicado, mas é assim que nós, seres humanos somos, complicados, cada um à sua maneira única." 

"Será que a relação com o belo nos eleva, nos torna pessoas melhores, ou será abraçando os doentes, os mutilados, os repulsivos que melhoramos a nós mesmos?" 

"Cuidado não é amor. Cuidado é um serviço que qualquer enfermeira que valha o que ganha pode fornecer, contanto que você não peça mais." 

"Não subestime o desejo em cada um de nós, o desejo humano, de estender uma asa protetora." 

"Nós todos gostaríamos de ser mais simples [...] Principalmente quando vamos chegando perto do fim. Mas somos criaturas complicadas, nós, seres humanos. É a nossa natureza." 

"O olhar amoroso não se ilude. O amor vê o que é melhor no amado, mesmo quando o melhor no amado acha difícil emergir para a luz." 

"Tudo no mundo um dia foi novo." 

"Nós temos filhos para aprender a amar e servir. Por meio dos nossos filhos, nós nos tornamos servos do tempo." 

"O amor não precisa ser recíproco, contanto que haja amor suficiente no quarto. [...] Se você ama muito profundamente, não precisa ser amado de volta." 

"Nossas mentiras revelam tanto de nós quanto nossas verdades." 

"Como é que a gente chama quando alguém conhece o pior de nós, o pior e mais danoso, e não diz nada, ao contrário, suprime tudo e continua a sorrir para nós e a fazer piadinhas? Chamamos de afeto."


 


11 de mar. de 2023

O Amante - Marguerite Duras

Título: O Amante
Autora: Marguerite Duras
Ano: 1984
País: França

Olá! Tudo bem? Espero que sim. Por aqui, estou bastante ansioso. Amanhã é o meu primeiro dia de trabalho no Rio de Janeiro e estou pensando sobre as inúmeras possibilidades que podem ocorrer durante esse período. Mesmo com toda ansiedade, só me resta a paciência… e os livros! Vamos lá! 

Iremos falar hoje sobre um livrinho que encontrei perdido no sebo da minha saudosa Caruaru. O título direto, a capa simples e o tamanho me chamaram a atenção. Acabei adquirindo sem saber qual era a história e ele acabou ficando um bom tempo na estante, até que, durante a mudança para o Rio, resolvi deixá-lo ao meu lado para poder ler durante o voo. Hoje iremos falar sobre O amante, da Marguerite Duras. 

Antes de começar a falar da história, é importante entender um detalhe importante do livro: a obra é um romance autobiográfico. A narrativa ganha um peso bem maior ao se compreender que a autora viveu realmente aquilo, além de que o conhecimento da história da Marguerite ajuda a entender algumas nuances da obra. Falo mais da autora no link.

Sobre a história, a protagonista não possui um nome e este não é necessário, já que a obra possui um teor intimista e onírico. Nos seus 15 anos, uma moça moradora na Indochina francesa, junto a sua família, apresenta um comportamento introspectivo, solitário e melancólico, sendo boa parte disto devido a sua relação familiar. A mãe, ao longo dos anos, afundou-se numa tristeza por conta de uma série de negócios malsucedidos que tentou empreender na região após a morte do marido, o irmão mais velho é problemático, envolvendo-se em uma série de pequenos crimes e age de forma desrespeitosa com os demais membros da família, mas possui tais comportamentos abafados pela mãe, por ser o filho preferido, o irmão mais novo que seria o laço de afeto da protagonista, mas que morre jovem. 

Seguindo a rotina, a adolescente, ao andar normalmente em direção a Saigon, é notada por um rico filho de comerciantes chineses que possui quase o dobro de sua idade. Ao abordá-la, a jovem francesa não apresenta nenhuma resistência e aceita dar uma volta de limousine pela cidade e acaba, após alguns encontros, tornando-se a amante do abastado herdeiro. 


Com o desenrolar da história, entramos em contato com os pensamentos da jovem garota. Como toda a dinâmica e conflitos familiares, sociais e econômicos acabam impactando na forma com a adolescente se enxerga, um ser pouco atraente, incapaz de exteriorizar feminilidade e ser alvo de afetos. Sendo diante deste universo melancólico que ela adentra no relacionamento com seu amante e troca experiências sobre suas vivências e perspectivas. 

Aqui é importante fazer um recorte de que o título do livro carrega um significado maior do que o uso clássico de amante. Ambos não possuem relacionamentos oficiais e não vivem um amor às escondidas. Porém, possuem impeditivos para sua relação. A protagonista é francesa e faz parte de uma família que vê com maus olhos o relacionamento com um homem asiático, além de saber que um relacionamento com uma diferença de idade tão grande pode ser vista com maus olhos. Já do lado do amante chinês, temos um homem que se recusa a compactuar com um casamento arranjado pelo pai, em que este não aceita a pobre francesa devido a sua condição socioeconômica e origem. 

Mesmo tão jovem, a garota consegue ver de forma bastante centrada toda a situação em que se encontra e parece ter noção de qual o único desfecho possível para o relacionamento que se encontra. O final do livro é reflexivo e carrega consigo uma memória triste e intensa. 

Crítica

O Amante vale bastante a leitura. É uma obra curta, mas não deixe que o tamanho o engane, o texto é intenso, profundo e desafiador. O fluxo de pensamento da protagonista, somado a melancolia e consciência do contexto em que se encontra, permite que o leitor adentre naquela realidade do sudeste asiático. Indico a leitura. 

Não esquecendo, como curiosidade, o livro foi adaptado para o cinema em 1992. 

Nota 4 ★★★★☆